Olhos de Ressaca


Já dizia o grande Machado de Assis, que a Capitu tinha olhos de ressaca. E o que isso significava? Que ao se olhar nos olhos dela, tinha-se a sensação de ressaca do mar. Quando se anda na beira do mar, seguindo em linha reta, não se percebe, mas a ressaca vai te puxando para dentro do mar, por isso é preciso cuidado. 

Não tenho olhos de ressaca, tão pouco estou acostumada com comparações poéticas como essa. E também não tem nada a ver com ressaca de álcool, já que nem beber eu bebo. Não, o que é de ressaca é minha vida, depressão, ou seja lá como isso chame. Não, nunca fui ao médico e não faço a menor ideia se tenho ou não depressão. Não, nunca me cortei e tenho pavor disso. Não, não fico dias e dias trancada no meu quarto, chorando, chateada.
Fresca. Falsa. Idiota. Fingida. Dramática. 
Já está bem grandinha para voltar à sua fase de rebeldia.
Cala a boca! Cala a boca e cala a boca! 
Não quero ouvir, não quero falar, não quero. Não quero, não quero e não quero. Tranco-me dentro de mim mesma. Essa mágoa que corrói feito ácido as entranhas, machucando por dentro, fazendo-me sangrar. No rosto um sorriso, não é falso, mas também as lágrimas não aparecem. Porque ao mínimo sinal de fraqueza, bombardeiam-me com críticas de que devo reerguer meus muros e não deixar que me atinjam. Mandam fechar-me, não posso ser atingida. Não posso chorar. Não posso ficar triste. Não posso ter cíumes. Não posso gritar. Não posso demonstrar fraqueza. Não não e não. 
E esse não dói. Olho para os lados e não há ninguém para abraçar. Ninguém que eu possa simplesmente abraçar e chorar, até me acalmar. 
Então, essa maldita sei lá o quê volta e me arrasta para o seu canto obscuro. 
Esmalte preto. Camiseta preta e sem forma. Jeans. All-star. Essa vontade louca de ouvir músicas fortes e não prestar atenção em nada. Querer não pensar. Logo eu... Não, não vou beber, nem fumar, nem drogar, nem cortar, nem nada do gênero. Apesar de ser maior de idade e de ter tido a fase rebelde rockeira apenas aos quatorze anos, essa vontade volta. E por um tempo, fico trancada em meu próprio mundo.
É mais fácil. Ninguém vai perceber mesmo. Ninguém sequer vai ver a trilha salgada de lágrimas em meu rosto redondo e sem beleza. Ninguém vai ver meus olhos verdes, agora vermelhos, por detrás dos óculos quadrados. Ela é forte, ela é feliz, ela é legal, ela é inteligente e esperta. Não é nada, não precisa de cuidados. Ela logo se reconstrói, não se preocupa.
Mas a verdade, é que ninguém sabe que por detrás desse muro pichado, mijado, sujo, por dentro, há uma garota frágil e com medo, abraçando-se a si mesma como se fosse sua tábua de salvação. 
E tudo o que ela queria, era somente alguém que a puxasse para fora dessa maldita ressaca

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