Enquanto eu como meu big mac de um lado da mesa, ela morde uma maça à minha frente. No intervalo, como doces: trufas, que delícia! Ela se limita a um chocolate, lamentando-se. Fala para os alunos sobre doenças relacionadas à obesidade, e eu engulo em seco, tendo plena consciência de estar acima do peso. E ela? Uma magreza que só vendo! E então, bate a insegurança. Será que eu seria assim, tão extraordinária para conseguir sair com uma moça como ela?
- Eu sei do que você está precisando... - o professor faz piadas maliciosas sobre objetos cilíndricos.
- Ah e preciso mesmo, estou em falta! - ela sorri, entre o choro e o riso.
E o que eu poderia dizer? Que de cilíndrico, só se forem dedos? Não, melhor ficar de bico calado mesmo.
- Ah eu li seu texto! - ela comentou, tomando água no bebedouro.
- Sério? Qual dos três? - estômago revirando.
- Aquele, das duas lésbicas... Como é mesmo o nome? - tentando se lembrar.
- Bem, na verdade, todos são de lésbicas. - sorriso amarelo.
- Ah entendeu. É aquele da criança...
- E o que achou? - estômago revirando, dores, borboletas, insetos, tudo revirando no estômago.
- Gostei! Bem escrito. Legal.
E nada, nadinha de nada de um sinalzinho qualquer, dizendo-me se ela se interessou ou não por meus textos entre mulheres. Como puxar conversa, sendo que quando ela sorri, eu me derreto? Seus olhos azuis claro, não posso parar de olhar! E que danados, nunca me olham de volta! E quando o fazem, demoro o olhar sobre eles, tentando achar aquela conexão, aquele feeling... Então, desvio antes de parecer estranha demais. Será que ficaria chateada se caso eu disesse que mal posso esperar para tocar aqueles ombros, beijar aquela boca, sussurrar naquele ouvido? Ela está solteira, qual o problema?
Incompatibilidades.
Ela é magra. E eu não. Ela gosta de exercicícios. E eu não. Ela prefere o silêncio, lugares calmos e tranquilos para refletir, fugir, pensar, relaxar. E eu prefiro uma madrugada em boates, teatros e cinemas. Ela tem 28, e eu saindo das fraldas com meus meros 19. Ela gosta de homens, e eu me encanto com mulheres. Essa, essa pequena diferença, pequena incompatibilidade, que me faz travar as pernas, engolir em seco, estrangular as perguntas que quero fazer, e guardar meus sentimentos para mim mesma.
- Assista o filme "As Horas" é muito bom! Super massa, e tem tudo a ver com o livro que está lendo. Vai gostar! - ela disse, semana passada.
Ontem, assisti ao filme só para comentar com ela. E que filme extraordinário! Com beijos entre moças, relacionamentos homossexuais, experiências, embutidos na vida de três mulheres. E hoje, quase morri de ansiedade para dizer-lhe:
- Amei o filme, realmente muito bom!!!
- Com certeza, o jeito como as histórias são contadas...! Tem outros filmes biográficos que gosto, que são ótimos também... - ela comentou.
Nada de diferente. Talvez seja eu, enxergando coisa onde não existe novamente. Incompatibilidades. Sim, muitas. Mas era sempre eu a lhe dar tchau quando deixava as crianças na sala, e quando eu não o fazia, ela também não, simplesmente saía. Hoje, despediu-se do professor da sala, das crianças, e eu ali, na porta, quieta. E quando saia, olhou para trás murmurando:
- Tchau.
Incompatibilidades.
Se até Eduardo e Monica deram certo, eu posso muito bem apagar dia após dia o "i" e depois o "n".
Compatibildades. Será?
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