Capítulo 29 – Vulnerável
Andando nas
nuvens! Não há outra maneira de descrever como eu me sentia naquele momento!
Depois que eles foram embora, eu sentei no sofá, olhando para o nada, com um
sorriso bobo no rosto. Marina e Carla ficaram me olhando, e esta, não
conseguindo segurar sua curiosidade, sentou-se ao meu lado perguntando:
- E aí? Aconteceu o que eu estou
pensando?
- Sim! – eu respondi passando os
dedos pelos lábios, lembrando-me do gosto de Priscila que ainda estava em meu
corpo. – Sentia tanta saudade daquele corpo...
- Nós percebemos. – Marina disse
entre risos. Eu arregalei os olhos, perguntando:
- Por quê? Vocês ouviram alguma
coisa? – não poderia ser...
- Bem, mais ou menos... Eu falava
cada vez mais alto para o Diego não perceber. – Carla começou a rir enquanto
contava.
Já tinha sido então
não havia mais volta, agora era esperar para ver. Mas uma coisa eu tinha
certeza: eu ainda veria Priscila novamente, e seria logo.
Acabei indo
para casa à noite e dormindo quando atingira a cama, estava exausta! Também,
pudera né! No dia seguinte acordei cedo, cantarolando alguma música alegre e
fui fazer meu café. Enquanto andava de um lado do outro da cozinha, fazendo o
café da manhã, lembrava com prazer da noite anterior. Priscila estava
extremamente linda! E eu tinha certeza que o seu amor por mim não havia mudado,
assim como o meu por ela. Nossos colares falavam por si só.
Acabando de
comer lavei a louça e as idéias começaram a polvilhar em minha cabeça, eu
sentia necessidade de colocá-las para fora. Andei até o meu quarto e peguei meu
bloco de folhas e uma caneta, sentei-me à escrivaninha que tinha ali e comecei
a rabiscar algumas palavras. Quando acabei, levantei com a folha na mão e
peguei o meu violão, comecei a compor a melodia da música. Dali a algum tempo,
a música já estava pronta, e eu com uma enorme vontade de mostrar para ela.
Peguei o
telefone e disquei os números do celular de Priscila, dali a alguns minutos,
ela atendeu, sabia quem era:
- Fala. – sua voz estava
descompassada.
- Irei naquela mesma praça daqui
a meia hora, se você quiser ir, estarei lá. – desliguei o telefone antes que
ela pudesse responder.
Estava
decidida a colocar um ponto final naquela história, aliás, recomeçar a história
seria o mais correto. Coloquei uma calça jeans, meus tênis all-star, camiseta
preta de alguma banda e amarrei o cabelo. Peguei meu violão, as chaves de casa
e saí porta à fora.
Andei pela
praça que estava praticamente vazia. Sentei-me embaixo de uma das árvores mais
afastada das ruas e comecei a dedilhar as cordas do violão. Eu tinha certeza
que ela iria, certeza esta que fora confirmada após alguns minutos. Priscila
apareceu vestida apenas com uma calça jeans e uma camiseta, uma rasteirinha e
os cabelos por sobre os ombros. Olhou-me curiosa, sentou-se no chão à minha
frente, sorrindo sedutoramente.
- Bom dia. – eu fui a primeira a
falar.
- Bom dia. – ela respondeu
sorrindo.
Olhei
profundamente em seus olhos, e sem dizer outra palavra, comecei a tocar a
música que eu havia composto exclusivamente para ela, naquela manhã. Priscila,
com as pernas cruzadas, apoiou o queixo sobre a mão, que estava apoiado na
perna, e ficou prestando atenção em mim. A melodia começou a se formar e eu
comecei a cantar:
“E quando eu
estiver triste
Simplesmente me abrace
Quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
Quando eu estiver fogo
Suavemente se encaixe
Simplesmente me abrace
Quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
Quando eu estiver fogo
Suavemente se encaixe
E quando eu estiver
triste
Simplesmente me abrace
E quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
E quando eu estiver bobo
Sutilmente disfarce”
Simplesmente me abrace
E quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
E quando eu estiver bobo
Sutilmente disfarce”
Ela
olhava-me com uma emoção nos olhos, eu a conhecia bem, sabia que a música mexia
com ela. E sem querer, acabei atraindo alguns olhares das pessoas à nossa
volta. Uma mulher que passeava com o cachorro, sentou-se no banco ao lado e
ficou ouvindo a música, assim como outra que passeava com uma criança
encostou-se à árvore, atenta. Olhei diretamente nos olhos marrons e senti-me
estremecer, ainda a amava com todas as forças! E faria de tudo para tê-la de
volta. Eu sabia que não era a única pessoa vulnerável naquela história.
“Mas quando eu
estiver morto
Suplico que não me mate, não
Dentro de ti, dentro de ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti”
Suplico que não me mate, não
Dentro de ti, dentro de ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti”
Depois que
eu cantei essa parte, lágrimas começaram a descer dos olhos de Priscila, ela
havia ficado muito abalada com as palavras da música. Quando acabei de cantar,
todos começaram a aplaudir e eu agradeci, e só então Priscila se dera conta de
que havia mais gente prestando atenção a nós duas. Ficou muito vermelha e não
sabia o que falar, parecia que queria fugir... E as pessoas, curiosas, voltaram
os olhos para ela.
- Eu escrevi para você. – eu
disse suavemente, esperava que ela me dissesse alguma coisa, qualquer coisa!
Menos o silêncio.
- Eu... É... Eu... – ela não
queria me encarar, suspirei frustradamente.
- Não gostou?
- Não é isso, é que... – ela
olhou para os lados, visivelmente incomodada com as pessoas que nos olhavam. Eu
prontamente entendi, mas queria ouvir da boca dela.
- O que é então? – perguntei
diretamente, fazendo-a olhar para mim.
- Não precisava chamar tanta
atenção só por causa de uma música. – a última palavra foi como uma pontada
dentro de mim.
- Como assim, SÓ por causa de
UMA música? Quer dizer que para você não tem importância? – as pessoas
pareceram se interessar mais, deixando-a mais envergonhada ainda. Mas
envergonhada de quê? De mim?
- Você sabe que não é isso,
Clarice. Eu só... Não gosto de tanta gente em volta e... – eu não a deixei
continuar:
- Quer dizer que você sente
vergonha de mim? Do que eu sinto por você e de como eu demonstro isso?
Era curioso
o olhar das pessoas à nossa volta, pois cada vez tinha mais pessoas. Eles não
olhavam com repulsa ou ódio, apenas com... Curiosidade. Querendo saber como
aquela história iria desenrolar-se.
- Por favor, não seja dramática,
você sabe que não é isso.
- Então o que é? – eu
perguntei impaciente.
Com a
cabeça baixa, os olhos no chão, Priscila levantou a mão mostrando um anel no
dedo anelar. Não podia acreditar no que meus olhos viam! As vozes ao nosso
redor se mostraram admiradas também.
- Eu tenho um compromisso. –
sua voz era quase sumida.
Não pude
segurar as lágrimas que insistiam em cair. Olhei-a e disse com uma mágoa na
voz, segurando o colar que estava no pescoço dela:
- E isso não significa nada
para você? Não era um compromisso? – seus olhos marrons encararam-me, profundamente
tristes, arrependidos.
- Significa, mas eu apenas não
posso... Entenda, por favor. – sua voz era cada vez mais baixa, para que
ninguém mais ouvisse somente nós duas:
- Eu te amo para sempre, mas
não dá. – e aumentando a voz: - Não posso mais.
- Por quê? – eu sussurrei, não
poderia ser deixada por ela mais uma vez.
Ela
levantou-se, olhando em meus olhos e quando ia responder, ouvimos uma voz
masculina atrás de nós, enquanto batia palmas:
- Muito bem, ótimo show! –
Diego apareceu ao nosso lado. Ficamos tão surpresas que não conseguimos dizer
nada.
- Acho que na verdade eu devia
estar participando, não? Sou o palhaço da história! – deu uma risada
sarcástica.
- Diego! Não, você entendeu
tudo errado... Não é isso que você está pensando! – Priscila agarrou-se ao
braço do namorado, que se soltou dela. Todos ficaram ainda mais atentos à
pequena ‘cena’ que se formara.
- Como que não? Eu ouvi tudo!
– ele gritou. – Há, eu sou mesmo um idiota! Agora tudo faz sentido! Os
gemidos... Os gritos... Eu ouvi tudo ontem! E aquelas suas amiguinhas
acobertaram! Vocês não valem nada! Não prestam!
- Por favor, não fale assim! Eu...
Não queria... – Priscila chorava enquanto Diego tentava se controlar. Virou
para mim dizendo:
- E a culpa é toda sua! – eu
não podia agüentar. Levantei-me gritando:
- Espera aí! A culpa não é
minha porcaria nenhuma.
- Não se faça de santa,
Clarice!
- Amor, por favor! Eu não
queria, ela que me obrigou! Eu juro! Nunca iria te trair! – vendo Priscila se
rebaixar aquele ponto, senti náuseas. Ela era uma mentirosa, sem caráter!
- Mentirosa! – eu gritei, com
lágrimas escorrendo dos olhos.
- Você apareceu na nossa vida
e ela piorou! Se você nunca tivesse aparecido, isso nunca teria acontecido! –
eu não iria deixar o Diego sem saber de nada. Sorri ironicamente e comecei a
dizer:
- Ah é? Pois fique sabendo que
quem é de fora aqui é você! Eu era namorada da Priscila, morávamos juntas, nos
amávamos. Foi por causa da família dela que a gente acabou terminando. Então,
se tem alguém de fora nessa história, é você! E outra, eu pelo menos não me
rebaixo, não sou uma mentirosa igual ela! Eu nunca a obriguei à nada, ela fez
tudo o que fez porque quis!
Todos
abriram a boca de susto e exclamação. Priscila olhou em volta, apavorada. Diego
olhou-a magoado e por fim ela disse, encarando-me:
- Você não tinha o direito! Eu
nunca mais quero te ver, ok? Suma da minha vida finja que eu não existo e que
nunca me conheceu! Você só me trouxe coisas ruins! Eu te odeio! – ela enxugou
as lágrimas do rosto com as costas da mão e saiu da praça arrastando Diego.
Fiquei ali,
parada, sem entender direito o que acontecera. Não, de novo não! As lágrimas
começaram sutilmente caindo dos meus olhos, comecei a soluçar, sentindo uma
enorme dor dentro de mim. Eu a perdia pela segunda vez. Será que tudo o que eu
fazia era errado?
Só percebi
o quanto estava mal, quando me dei conta de que a moça que estava com o
cachorro me abraçava, consolando-me. Fez-me sentar no banco ao seu lado,
enquanto dizia:
- Por favor, moça, fique
calma. Vocês vão se acertar.
Olhei-a,
era uma pessoa muito gentil. Agradeci mentalmente por isso e continuei ali a
chorar, não tinha chão, não conseguiria sair dali tão cedo. Por quê? Porque era
tão difícil amar? Não sabia o que fazer, mas uma coisa eu tinha certeza: apesar
de tudo, seu amor não acabara. Não me pergunte como, eu apenas sabia, ou pelo
menos queria acreditar que não acabara. Que nós iríamos voltar. Seria
impossível que eu fosse a única vulnerável.
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