Conto
– Caras Como Eu, Garotas Como Você
Sentado na cama,
o copo de uísque na mão. Tomou mais um gole, a bebida desceu raspando a
garganta. Como ele a queria de volta, Deus, como ele daria tudo para tê-la de
volta! Mas isso era impossível. Esfregou os olhos vermelhos, a insônia vencia
mais uma vez. Olhou para o apartamento em estado lamentável, copos espalhados,
xícaras de café inacabadas, meias, roupas e cuecas espalhadas pelo chão,
sapatos faltando um par, cds, dvds e livros em cadeiras e mesas. Um resto de
pizza de queijo ainda na caixa, pratos de comidas congeladas se amontoando na
pia. Que grande bagunça, como se ele se importasse.
Fez
uma careta e virou o resto do líquido na boca sedenta. Jogou o copo vazio na
parede, que se espatiçou, caindo em pedaços pelo carpete. Que novidade, tudo na
vida dele se quebrava com a maior facilidade, incluindo o seu coração. Quem
disse que homens são canalhas, galinhas e não conseguem amar somente uma mulher
está dizendo a maior das falácias já inventada nesse planeta chamado Terra.
Homens podem amar uma única mulher, e o fazem, mas geralmente elas partem,
então eles enchem suas vidas vazias com cerveja, mulheres e música, dessa
maneira esquecem da dor da perda. Mas ele não era assim, não era um cara
qualquer, não conseguia esquecê-la.
Tantas
outras garotas já haviam passado por suas mãos, sua boca, seu pau. Mas nem uma
se encaixara tão perfeitamente nele quanto ela. Nenhuma tinha o sabor e o gosto
tão doce quanto o dela. Nenhuma delas, era ela. Fodia os corpos, gritava
insanidades, bebia da cerveja e do uísque como se fosse água, acompanhava
qualquer jogo de futebol que aparecesse pela frente, ouvia qualquer balada
sertaneja, qualquer hit da moda que não o fizesse pensar, só seguir na batida
do “le rê le rê”. Tentava em vão fazer algo fora do comum, algo que não fosse
do seu feitio, algo que fosse para a maioria das pessoas, normal, mas que para
ele era o maior dos sacrifícios. Tudo para ver se conseguia se encaixar. Pois
quando fora ele mesmo, com toda a sua excentricidade, sua verdade, felicidade e
seu ser, perdera a pessoa mais importante em toda a sua vida.
A
garota que caíra em sua cama, adorando o colchão fofinho, rira do seu pijama
guardado do bob esponja, que gritara ao ver uma barata e que lhe batera no ombro
por tê-la assustado daquela maneira. A garota que torcia o nariz ao sentir o
cheiro de café forte pelo quarto, e insistia em abarrotar os armários dele de
chás. E quando ele argumentava que não tomava chá, e que vivia sozinho, ela
retrucava:
- Bem, eu venho aqui e eu tomo esse chá.
Logo, deixe que fiquem aí, não irão lhe atrapalhar.
E
nisso ela tinha razão, não atrapalhavam. Metade do seu guarda-roupa guardava os
vestidos, as saias e as sapatilhas dela. Os livros eram catalogados por gênero,
faculdade/diversão, e uma etiqueta escrito “dela”. Por que tantos cds da Mariza
Monte, Kid Abelha, Rita Lee, Paralamas, se ele nem gostava tanto assim? Porque
num dia de chuva ela os trouxera para ouvirem juntos, e eles foram ficando e
ficando até ficarem esquecidos. Achou graça quando instalou a tv nova, com
programação interessante, e ela quase vibrou descobrindo os canais que falavam
sobre entreterimento, com teatros e atores antigos e importantes. Mas achou o
presente mais importante mesmo, aquele bombom ouro branco que você lhe deu
quando ela estava chorosa e de tpm, e que ao desembrulhar o bombom, topou com
uma frase romântica que mudou o dia dela. E você ainda jura que escolhera
qualquer um, só pra ela ficar mais alegre.
Você
ainda sorri com o jeito como ela franze o nariz, o jeito como ela briga com
você, toda altiva e cheia de si. Como o orgulho dela é maior do que certas
coisas, como ela diz as coisas por entrelinhas e você, bobo, raramente cai. Ou
sempre cai. E uma lágrima rola pelo olho vermelho, relembrando das palavras
duras dela de separação. E você se pergunta o que fez de errado. E pondera se
talvez não é totalmente errado, estúpido, homem, como todos os outros, e por
isso mesmo a perdeu.
Relaxa
amigo, eu não sou homem e perdi alguém especial do mesmo jeito. Se lhe serve de
consolo, talvez eu tenha feito mais burradas que você, em toda a sua vida, e
tenha sido mais covarde que você, em toda a sua coragem. Ela não vai ligar para
o seu apartamento, não vai ligar se seu bafo cheira à bebida, não vai se
importar em secar suas lágrimas, se lhe disser como sente a falta dela, e que
você não é um homem completo sem a presença dela. E ela vai sorrir, lhe
abraçar, lhe dar um tapinha nos ombros e dizer que você é o maior idiota da
face da terra, mas que ela lhe ama e precisa lhe por nos eixos. E no meu caso,
meu amigo, eu ainda ando por aí com as mãos nos bolsos, à procura de algum amor
que faça sentido, que não seja tão pouco a ponto de esquecer ao raiar do sol,
mas que não seja tanto ao ponto de me cegar, pois a única loucura que me era
permitida, foi-me arrancada sem dó nem piedade, me deixando esmaecer nessa
sanidade, vagando pelas ruas, dando conselhos aos apaixonados, e lamentando
pelos caras como eu, que se deixam dominar por garotas como você.
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