Conto - Daylight



— O que você está pensando? – ela me perguntou, rolando sobre o meu corpo e passando seu braço em volta da minha cintura.

— Estou pensando na vida... – respondi enigmática, sentada na cama.

— Na vida? – eu olhei-a de volta, sorrindo. Ela estava encostada em meu corpo, o nariz roçando em minha barriga.

— Sim... Em como viemos parar aqui... – desci minha mão pelas suas costas nuas, acariciando-a.

— Com as próprias pernas, creio eu... – e começou a rir da própria palhaçada.

— Isso também. Mas eu quis dizer aqui, nessa cama... – suspirei, olhando-a séria. — Foi tudo tão... Rápido... – dei um sorriso de canto, movendo minha perna e colocando entre as dela.

“Here I am waiting, I have to leave soon
Why am I holding on?
We knew this day would come
We knew it all along, how did it come so fast?”

Eu a olhava sorrindo, tentando fazê-la rir, e quando conseguia, era só festa! Seu riso enchia o bar, e virava música aos meus ouvidos. Suas mãos tocavam as minhas por cima da mesa, e eu fingia que aquilo era a coisa mais natural do mundo. Apesar da vergonha, tentava puxar assunto, rir com ela, fazer com que aquele encontro valesse a pena, que não fosse apenas mais uma noite com uma colega qualquer. Se eu soubesse no que aquela noite iria levar...

“This is our last night, but is late
And I'm trying not to sleep
'Cause I know when I wake
I will have to slip away”

— Eu sei... Mas sei lá... A vida é assim... – ela deu de ombros, mordiscando minha barriga.

— Sim, foi o que eu disse! – comecei a rir e fui escorregando pela cama, até me deitar ao seu lado, com seu abraço ainda em mim.

— Então está reclamando de ter acontecido tão rápido? – ela me perguntou, levantando uma sobrancelha, fingindo braveza.

— Como eu estaria? Se eu queria tanto te ter aqui, todinha pra mim? – virei de lado, passando meu braço pela cintura dela, mordendo o queixo de leve, enquanto sorria.

— Safada... – ela sorriu de volta.

— Sou mesmo... E você adora! – beijei-a gentilmente, sentindo aqueles lábios rosados que tanto me chamavam atenção.

“And when the daylight comes I'll have to go
But tonight I'm gonna hold you so close
'Cause in the daylight we'll be on our own
But tonight I need to hold you so close

Whoa whoa whoa”

            Quando me decidi em pular em sua cama, nunca pensei que teria coragem para tal. Eu simplesmente o fiz. Deitei, abraçando-a, encostando meu nariz de leve em suas costas, manhosa, fungando de leve. Ela ria, dizia que arrepiava, e eu continuava. Por dentro, eu tremia de medo. Mas sempre fui corajosa para essas coisas, mesmo morrendo de medo. Sustentei os carinhos, até olhá-la pedindo para ficar ali a noite toda. E ela concedeu.

“Here I am staring at your perfection
In my arms, so beautiful
The sky is getting bright and the stars are burning out
Somebody slow it down”

            Tudo aconteceu naturalmente. Como se fosse para ser. Ainda que no quarto escuro, eu podia distinguir suas feições, seus cabelos longos e castanhos, e eu não conseguia parar de pensar “está mesmo acontecendo...”. Suas mãos passearam pelo meu corpo, conhecendo-me, desvendando-me. Seus lábios beijando-me completamente, ela me mordia, realizando todas as nossas fantasias. Meus gemidos a faziam sorrir, sabendo que havia acertado. Aliás, ela tinha feito tudo certo.

“This is way too hard, 'cause I know
When the sun comes up, I will leave
This is my last glance
That will soon be memory”

            Experimentei-a, degustei do seu mel, e não quis mais saber de outra coisa. Se eu pudesse, não saía mais dali. Deixei meus dedos deixarem minhas digitais em suas costas nuas, e minhas unhas trilharem caminhos vermelhos por todo o seu corpo. Eu queria marcá-la, para que ela se lembrasse de mim, mas não tive coragem de deixar vergões pelo seu corpo. Seria inadmissível naquela pele clara e macia. E então, depois de gemidos de prazer, os corpos exaustos entrelaçados entre os lençóis, a luz do dia começou a se fazer presente, quebrando o encantamento.

“And when the daylight comes I'll have to go
But tonight I'm gonna hold you so close
'Cause in the daylight we'll be on our own
But tonight I need to hold you so close
Whoa whoa whoa”

— Eu não quero sair daqui... – confessei, aninhando-me em seus braços.

— Mas infelizmente precisamos... – ela suspirou, olhando-me tristemente.

— Se eu pudesse ficar aqui, todas as noites, contigo... Todos os dias... – sorri, passando minhas mãos pelos seus braços, mordendo-lhe o ombro.

— Eu também gostaria... – ela gemeu baixinho, fechando os olhos.

            Por tanto tempo eu procurei pelo certo. Pelo eterno. Por tanto tento me desmanchei em lágrimas e lutei contra o destino. Aliás, briguei com ele, e depois acreditei nele. Meias verdades e meias mentiras. Acreditei que ele iria me guiar pelo caminho que eu queria seguir. Por tanto tempo eu quis ser dona de mim! Quis esperar, fazer tudo certo, guiar-me pela razão. E no fim, o que isso tudo me rendeu? Apenas dores, fantasmas e correntes difíceis de suportar.

            Tenho medo de colocar meus pés num barco que irá zarpar. Ao mesmo tempo em que quero ficar, não quero ficar só. Atropelo-me em palavras e sentimentos, porque quero ter a certeza de que não vou me jogar de cabeça em um mar de pedras. Eu quero ficar, mais que tudo, mas não posso me perder novamente. Não posso me desfazer, porque ninguém além de mim irá recolher os pedaços.

“I never wanted to stop because I don't wanna start all over, start all over
I was afraid of the dark but now is all that I want, all that I want, all that I want”

— E se eu te pedisse para ficar? – encarei-a.

— Eu não posso... – ela suspirou.

— E se pudesse? – sustentei o olhar.

            Ao invés de responder, ela se aninhou mais em meu corpo, passando a perna entre as minhas, sua mão me acariciando, e aproximou o seu rosto do meu, mordiscando meu pescoço, distribuindo vários beijos e me olhando de volta. Ela sorriu. Eu sorri de volta. Encostei minha cabeça em seu peito, agarrando-me a ela, tentando aproveitar aqueles últimos momentos antes que o sonho se desfizesse, e sussurrei baixinho:

— Eu vou voltar.

“And when the daylight comes I'll have to go
But tonight I'm gonna hold you so close
'Cause in the daylight we'll be on our own

But tonight I need to hold you so close”

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