Capítulo 2 - Encontros Inesperados
A primeira vez que se viram não foi nada incomum, pelo contrário, não existe nada mais comum do que um esbarrão no meio da rua. Mas o que conta não é como se encontra, e sim quem se encontra. Naquele dia, Carmen tinha brigado com o namorado e estava fora de si. Saiu correndo no meio da calçada, as lágrimas quase secas pelo vento que batia em seu rosto. O dia estava nublado, comum, triste, o que contribuía com o seu estado de espírito. Virou uma esquina correndo e só sentiu o impacto de algo batendo contra o seu corpo, fazendo com que ela caísse no chão.
- Caralho! Presta atenção por onde anda! – gritou ainda se levantando do chão.
- Desculpa, mas quem veio correndo sem olhar foi você! – disse uma voz rouca e feminina, sedutora.
Ela resolveu retrucar e levantou a cabeça, deparando-se com a mulher mais linda que já vira em toda a sua vida. Uma ruiva de cabelos compridos e encaracolados, olhos verdes, prontos para devorá-la. Um corpo de dar inveja, dentro de uma calça jeans justa, blusa decotada de oncinha e salto alto. Seu queixo caiu, e a estranha pareceu gostar disso, tanto que analisou a situação por um momento, abriu um sorriso, estendeu a mão e disse:
- Peço desculpas novamente. Por que não vamos tomar um café?
Naquele momento, Carmen esqueceu de que chorara, esqueceu do por que chorara e quase se esqueceu do esbarrão. Seguiu a estranha até um café ali perto, sentaram-se em uma mesa no canto, e começaram a conversar.
- Posso saber o nome de quem eu atropelei? – a ruiva perguntou com um sorriso no rosto.
- Carmen. – riu. – E o seu?
- Margaret, prazer.
- Nossa, que nome... – a outra a interrompeu:
- Estranho eu sei. – a ruiva sorriu.
- Bem, eu ia dizer “bonito”.
Margaret riu, agradecendo, parecia que já estava acostumada com elogios, e não ficava sem graça quando os ouvia. Também, pudera! Linda daquela maneira! Carmen tomava seu café, de vez em quando dando mínimos sorrisos no canto da boca, demonstrando que apreciava a conversa.
- Onde trabalha? – perguntou Carmen, tomando mais um gole de seu café.
- Em uma danceteria, casa de show, ou o que seja lá que queira chamar. – balançou o ombro minimamente.
- Interessante. E você dança lá?
A ruiva respondeu-lhe que sim, sem demonstrar mais tanta atenção. Achou que aquela moça era mais uma tonta que não se interessaria em seu trabalho, e não valeria à pena investir nela, nem mesmo para chocar-lhe um pouco. Levantou-se, pedindo desculpas e dizendo que precisava ir embora, seu trabalho a chamava. Carmen, mais que depressa, se levantou também, não queria perder a estranha de vista.
- Espere, não vá ainda, eu... Gostaria de te ver de novo. – não fazia idéia do porque dissera aquilo.
- Hum... – a ruiva avaliou um pouco a outra, depois pegou um guardanapo e uma caneta e escreveu o endereço da boate.
- Eu sou uma prostituta, eu danço, faço streap tease, deixo todos loucos. – saboreou o efeito que suas palavras tiveram na morena, antes de entregar-lhe o papel.
- Não tem problema, eu vou assim mesmo. – a morena sorriu, curiosa, nunca havia ido a nenhum lugar como aquele.
Margaret deu um sorriso malicioso, dando um beijo no cantinho da boca da estranha, e saiu do lugar. Tinha certeza que a outra iria mesmo, provavelmente estava errada sobre sua nova... Amiga. Bem, não iria fazer mal, na pior das hipóteses, Carmen ficaria horrorizada com o que visse lá. Ou aproveitaria para tirar um proveito da situação, ou sairia correndo direto. Margaret já estava acostumada com situações assim, e para falar a verdade, até divertia-se com elas.
Carmen voltou para casa, o namorado já era algo esquecido. Algo na estranha lhe era familiar, e ao mesmo tempo, algo lhe dizia para ficar longe, mas ela não escutava, nunca escutava. Passou o dia todo remoendo o que Margaret lhe dissera. Como seria conhecer uma prostituta? Até aquele momento, pareceu como uma mulher qualquer, fora o fato de que não a vira em ação. Seu ex-namorado era doido por mulheres e sempre queria levá-la para lugares que tivesse trocas de casais, mulheres seminuas dançando, e ela nunca dera bola. Até aquele momento. Sabia que não fazia parte daquele mundo, mas sua curiosidade era maior do que tudo.
Arrumou-se toda para a noite, escolheu um vestido curto e preto, botas de bico fino e salto alto preto, os cabelos pretos e na altura dos ombros penteados para trás, lisos, usou uma maquiagem pesada. Colocou brincos de argola de prata, uma corrente prata e algumas pulseiras, e saiu, dirigindo. Não sabia onde era a boate, e teve dificuldades para achar.
Dirigiu por uma das principais ruas de São Paulo, durante uma meia hora, depois virou a esquerda em um bairro, virou à direita, andou reto, fez uma rotatória, atravessou uma ponte e foi parar em uma esquina mal iluminada. Estacionou o carro ali, esperando que ninguém o roubasse. Na segunda rua, viu um letreiro em cima de uma porta preta, escrito: Dirty Girl Night Club. Achou estranho, mas resolveu entrar, já que quem está na chuva é para se molhar. Na porta, havia duas mulheres, grandes, gordas, cabelos curtos e negros, com uma expressão séria. Usavam ternos pretos e a barraram na entrada.
- O que quer aqui? – a mais alta perguntou.
- Eu... Eu... Vim ver Margaret dançar. – balbuciou. As seguranças se entreolharam, com um sorriso compartilhado.
- Dez reais para entrar. – a mais nova disse.
Ela entregou uma nota de dez para uma delas e entrou. Havia uma escada estreita de pedra, ao qual ela subiu. Deu em um enorme salão, escuro, com luzes coloridas pelo local, a música quase ensurdecedora. Esperou alguns segundos até se acostumar com a iluminação, e então começou a se surpreender. Ao seu lado, duas garotas sentadas em uma poltrona, meio largadas, com um camisetão, boné de lado, tênis e calça jeans. A mão dentro da calça, como se coçasse um saco imaginário. Cigarro pendurado no canto da boca macia. Contanto que não fosse ela que usasse aquele estilo, não a incomodava tanto assim.
Continuou andando e viu um cara grandão, forte, todo tatuado, sentado, com uma garota dançando em cima do colo dele, de saia curta, top e piercing no umbigo. Estilo “glamoroso”. Depois de ouvir tantos funks pelas ruas de Sampa, aquilo não mais incomodava. Aproximou-se do bar, e viu um travesti sentado em um dos bancos, tomando um copo de uísque. Ele usava uma calça colada preta, blusa colada rosa e jóias (estavam mais para bijuterias), os cabelos loiros arrumados em um rabo de cavalo.
- Hey Berto, me dá mais um gole de vinho que já, já subo ao palco. – aquela voz, bem ao lado dela. – Não acredito que você veio mesmo!
- Bem, eu disse que viria. – Carmen estava surpresa, Margaret estava linda, e olha que ela não conseguia ver tudo, pois esta usava um roupão cobrindo-lhe o corpo.
- Vá lá para a frente do palco, e quando eu acabar a minha apresentação, vá para a parte de trás. Vai ter um segurança lá, apenas diga “Luxúria” e ele te deixará entrar no meu camarim. – piscou um olho, dando-lhe um beijo estalado na bochecha.
Pegou o copo com vinho e sumiu no meio das pessoas novamente. O barman olhou para a pequena Carmen, os olhos dela brilhando ao ver a estrela do lugar. Ele balançou a cabeça negativamente, sentindo pena da garota, mais uma das conquistas de Margaret. Entregou para ela uma bebida, por conta da casa, dizendo:
- Hey, garota, eu posso lhe dar um conselho? – como ela nada disse, ele continuou. – Não entra nessa não, vai embora enquanto é tempo. A Margaret não é mulher para você.
- Como pode saber? Me deixa em paz, ok? Sei cuidar de mim mesma. – pegou o copo e saiu do bar.
Ele apenas deu de ombros, estava acostumado com essa resposta. Só lamentava que ela iria se arrepender amargamente da sua escolha. Uma das outras prostitutas se aproximou do bar, saia curta e rosa, blusa preta e decotada, a maquiagem manchada, cigarro nos lábios. Segurou na cintura do travesti que estava sentado, lançando-lhe um sorriso. Retirou o cigarro da boca, dando-lhe um beijo ardente de desejo, mordendo seus lábios e apertando sua bunda.
- Vem, eu te dou uma de graça, só para você não perder a noite. – e levou ele para um dos quartos que havia na parte de cima do local. As luzes começaram a piscar, indicando que o show ia começar.
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