Fúria Insana


Aquela parecia ser sua melhor festa em anos. Olhou-se no espelho, achando-se magnífica. Virando de um lado para o outro, admirando-se, achava que as roupas não eram exatamente o que ela escolheria para si, mas talvez fosse disso que ela precisasse, uma mudança. Talvez precisasse deixar os tênis e os jeans guardados no armário, e abusar dos vestidos e da maquiagem. Entrou na festa com a confiança que sempre lhe fugia, mas que naquele momento persistia. Cabeça erguida, sorriso no rosto, pose de artista. Seus quinze minutos de estrelato. Naquele momento, ela era especial, ela era bonita, ela era vista. Todos logo a reconheceram, tirou fotos, e era somente sorrisos. Talvez... Quem sabe, um pouco de sacrifício fosse realmente necessário.

Aguentou a dor nos calcanhares, a respiração dificultada pelo vestido branco apertado, o cabelo preso no alto da cabeça. Teve o seu clímax, desfilando em passos marcados e cadenciados na frente de tanta gente, os olhos desfocados, sem poder saber se era o seu sucesso ou o seu fracasso. A casa estava meio vazia, e enquanto caminhava por entre as pessoas, a insegurança começou a lhe apertar o peito. Todos voltavam os olhares para ela, mas e se fosse por que ela estava ridiculamente idiota naquele modelito ultrapassado? E se sua apresentação tivesse sido um fiasco? Tremeu no salto, mas se recompôs, cabeça para o alto. Se ela apenas dançasse conforme a música, esquecesse de tudo, a noite seria mais proveitosa. Mas conforme tentava se soltar, sentia-se presa. Sufocada, pelo vestido, os saltos, o cabelo, os olhares. Amarras que a seguravam, forçando-a a ser quem sempre odiou. Em poucos segundos, já não havia mais espaço para o glamour, só a vontade da libertação. Tentava se movimentar, mas estava cada vez mais difícil. Ninguém parecia perceber, mas ela quase não respirava. Em um ato de fúria insana e impensada, o grito soltou-se dos seus pulmões sedentos por ar, e ela começou a rasgar o tecido branco que lhe cobria. Arrancou os sapatos dos pés, finalmente sentindo a frieza do piso; bagunçou os cabelos, acabando com o penteado, arrancou as pulseiras e os anéis dos dedos. E enquanto uma multidão vinha ao seu socorro, em preocupações, ela olhava para cima, respirando profundamente, com os braços abertos, sentindo-se finalmente livre. Por um breve instante de loucura momentânea, ficou paralisada, e então voltou-se para os dançantes, dizendo que estava bem. Ninguém a deixou em paz, enquanto ela não explicasse rapidamente que fazia parte de uma apresentação à parte. Mesmo com os rostos de descrença, como sempre, voltaram aos seus passos complicados e bebidas alcoólicas. Sentindo a música, o ar, a felicidade, e a liberdade, deixou-se levar pela melodia, remexendo-se nas batidas. E dançou, dançou como nunca, perdeu-se no meio do salão, perdeu-se em si mesma, e encontrou-se na vida.

Nenhum comentário

Postar um comentário

Layout por Maryana Sales - Tecnologia Blogger