Anne & Anna - O café


O Café

Ela estava ali. Ela sempre estivera ali. Sentada sozinha em sua mesa preferida na Starbucks, aquelas dentro da cafeteria, em um banco confortável, tomando seu cappuccino e comendo um lanche de peito de peru. Seus olhos sempre fitando o livro que sempre trazia consigo. Não interagia com as outras pessoas, gostava da quietude e da tranquilidade. Talvez por isso eu nunca tivesse reparado nela; meus olhos sempre buscavam tantas garotas que passavam a minha frente, todas tão diferentes, falantes, extravagantes. Escrevia histórias sobre elas, imaginava suas vidas, queria conhecê-las e entendê-las. Eu buscava uma história de amor, mas todas me davam pequenas crônicas em conta-gotas. Nunca me ocorreu simplesmente aquietar-me e sentir as vibrações em minha volta. Então, em um dia qualquer, após outra decepção amorosa, sentei-me calada na cafeteria. Sentia-me solitária, amarga e triste, assim como os tantos cafés que eu adorava tomar. Meu olhar vagava pelo ambiente, até pousarem sobre a garota de cabelos pretos e lisos sentada no canto do lugar. Ela olhou-me, sorriu, e voltou a sua leitura. Rapidamente interessei-me por ela. Geralmente eu demorava séculos para me aproximar, apenas observando minhas pretendentes, mas dessa vez resolvi tentar a sorte. Caminhei calmamente até ela e me apresentei. 
— Olá, meu nome é Mariana – estendi-lhe a mão. Seus olhos piscaram por um segundo, ela sorriu e respondeu:

— Prazer, Marianne. 

— Uau, que coincidência! Quase o mesmo nome! Só pode ser algum sinal... – brinquei. 

— De que nossas mães têm bom gosto – ela sorriu, respondendo simplesmente. 

— Ou talvez o indício de que temos muita coisa em comum. Como estar na mesma cafeteria nesse exato segundo, por exemplo – continuei seguindo minha linha de raciocínio. 

— Eu estou sempre por aqui. E já percebi que você também. Costuma sentar-se nas mesas do lado de fora, pedir um café, um bolo de chocolate e conversa com várias garotas – ela deu de ombros, tomando um gole da sua bebida.

— Como você sabe de tudo isso? Você é bem observadora... – comentei intrigada, achando engraçado o fato de ela saber um pouco sobre mim sendo que eu nunca a havia notado. Geralmente eu que observava as pessoas, não o contrário. 

— Sim, eu sou – ela respondeu voltando os olhos para o seu livro, como se encerrasse a conversa. 

— Posso me sentar ao seu lado? – perguntei. Não podia deixar aquela oportunidade passar. 

— Tudo bem.

— E posso fazer uma pergunta? 

— Vá em frente – ela suspirou, guardando o livro, percebendo que eu não a deixaria em paz tão cedo.

— Você é hetero? – mordisquei o lábio, xingando-me mentalmente por tal pergunta.

— Sim, eu sou – ela riu, olhando para cima, achando graça da minha pergunta. — Eu sei que você não é, e não me incomodo com isso. 

— Ainda bem! – senti-me um pouco relaxada. 

Pedi um cappuccino igual ao dela e não tardou para que começássemos a conversar. Tínhamos muito assunto e eu não estava errada: tínhamos muito em comum. Assistíamos às mesmas séries, gostávamos das mesmas cantoras, estivemos nas mesmas festas e tínhamos amigos que se conheciam. E para alguém que passava tanto tempo em silêncio, ela conversava bastante comigo. Eu sabia que aquilo não podia ser uma simples coincidência. O nervosismo me corroia por dentro, com medo de dizer algo errado, mas eu tentava manter a calma e continuar conversando. Eu sentia que poderia conversar uma noite inteira com aquela mulher. 

Enquanto ela falava, eu a observava. Seus olhos eram negros e puxados. A linha dos seus olhos chamou-me a atenção e tomei nota mental para escrever uma bonita poesia sobre eles mais tarde. Seu sorriso aqueceu meu coração e eu vi-me maravilhada ao fazê-la sorrir – coisa que eu continuaria sentindo no decorrer do tempo –, contando alguma coisa engraçada que acontecera comigo. Ela era linda, simplesmente linda. Ela pegou seu copo de café e eu reparei em suas mãos; dedos longos e unhas vermelhas, tão bonitas. 

O tempo passava e sentimos fome. Pedimos bolinhos e continuamos o papo, como se não houvesse nenhum compromisso que pudesse nos tirar daquele mundo particular. Uma conexão foi estabelecida naquele dia. Não sei precisar como nem mesmo o porquê, mas eu sentia que poderíamos ter uma história legal, algo que pudesse durar mais do que um simples olhar, mais do que um mero encontro ou uma promessa de amizade. 

— Nossa, está tarde! – ela olhou para o relógio de pulso dourado. 

— Realmente, nem vimos o tempo passar! – do lado de fora a escuridão já caía. 

Levantamos, pagamos a conta e nos encaminhamos para a saída. A noite estava bonita, o céu estrelado e a lua, alta. Ela estava de carro e ofereceu-me uma carona, a qual eu prontamente aceitei. Não estava a fim de ficar andando naquele vento que a noite trazia. Enquanto ela dirigia tocava músicas animadas no carro, e fomos cantando junto com a melodia. Ensinei-lhe o caminho da minha casa e quando ela parou em frente ao prédio, chegou a hora da despedida. Mas eu não queria deixá-la. Não justo agora. Trocamos números de telefone, prometendo mantermos contato, afinal, gostamos uma da companhia da outra. 

— Salvarei como Anne – ela comentou alegre. 

— E eu salvarei seu número como Anna – pisquei para ela e caímos na risada. 

— Obrigada pela noite agradável – ela agradeceu, dando-me um beijo no rosto. Seus lábios eram suaves e seu perfume, muito gostoso. 

— Eu que agradeço. Foi realmente muito bom conversar com você. 

— Podemos combinar outros passeios – ela sorriu pra mim. 

— Encontros? – mordisquei o lábio.

— Não exatamente. Mas valeu pela tentativa – ela deu uma piscadela e um suspiro.

— Ok, ok. Até mais então. 

Desci do carro e fiquei olhando enquanto ela acenava pra mim pela janela aberta e ia embora. Foi inusitado como tudo acontecera naquele dia, e eu mal podia acreditar em minha sorte. De qualquer forma, tentei me acalmar e não criar muitas expectativas, pois eu sempre me frustrava. Às vezes um flerte era só um flerte, e um encontro era só um encontro, não um romance em potencial.  



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N/A: A ideia pra esse texto surgiu enquanto eu ouvia a música "Eu amei te ver" do Tiago Iorc e pensei em fazer uma "série de contos" sobre a história de Anne & Anna, como se fosse uma história longa, mas sem o compromisso de uma; como se vocês acompanhassem pequenos contos/crônicas sobre aonde essa 'coincidência' chegou e se houve mais entre elas do que uma simples amizade. Espero que gostem da experiência e da história. Estou feliz por finalmente escrever algo após tanto tempo parada. E algo de que eu gostei. Obrigada! 

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