Linhas


Domingo, mais de sete horas da noite, o metrô está quase vazio. Até mesmo aquela linha vermelha, quase vermelha de sangue se for lá pelas cinco e meia da tarde, está meio solitária. Acesso à linha azul, ainda faltam diversas estações até aquela em que preciso descer. Entrei no vagão e sentei-me em um baco azul. Na primeira oportunidade me mudo para perto da outra porta, banco marrom, dessa forma não preciso me levantar caso entre um idoso ou deficiente. Ouvindo minha música, cansada, observando as poucas pessoas que estão no vagão, entra um casal e senta perto. Ela, com um bebê no colo. Ele, com a bolsa da criança no ombro. Perto da porta um senhor já de idade, com uma bengala. As estações passam, e então o senhor se levanta. Escuta o trem parar, e então ele pergunta:
- Aqui é a Sé? - e a moça ao seu lado responde:

- A Sé já passou. - ele parece meio perdido, sem saber o que fazer. Pensa em descer naquela estação mesmo, mas o apito de atenção toca e ele resolve voltar a sentar. 

O casal assiste à mesma cena. O homem se levanta, a passos largos alcança o senhor, aproxima-se e pergunta:

- O senhor precisa descer na Sé? - e o velho faz que sim com a cabeça. 

O homem volta e se aproxima da mulher, dizendo palavras como "são só algumas estações." Eles se levantam. Ela carrega o neném nos braços. Ele volta a se aproximar do senhor, diz que irá descer com ele, e assim que o velho se levanta, ele lhe dá o braço. E quando na próxima estação as portas se abrem, o casal desce com o senhor, e desaparecem de vista. As portas se fecham. E o trem continua rumo ao seu destino. Eu não sei em qual estação esse casal iria descer... Mas eles se desviaram do seu próprio caminho para ajudar um senhor que estava perdido de seu caminho.

Diariamente vemos pessoas se espremendo dentro dos vagões, uma massa sem dó nem piedade empurrando seu corpo para dentro daquela lata de ferro, e sem vergonha nenhuma de passar por cima caso você caia. Pessoas que não são pessoas. Pessoas que são massa. Sem rostos, sem expressões. Diariamente olhamos isso e pensamos como estão desumanizados, como o mal se alastra em nossa sociedade. Pensamos que não há espaço para o bem, para gentileza, ninguém irá te ajudar. Mas diariamente... Diariamente há casais que se desviam do seu caminho para ajudar um idoso a descer onde precisa. Diariamente há pessoas dispostas a lhe ajudar e fazer o bem sem olhar a quem. Diariamente encotramos gestos, ainda que pequenos, de gentilezas e bondade. Mas os ignoramos, julgando-os pequenos demais e sem importância. Talvez devêssemos prestar mais atenção a esses gestos e perceber que há sim bem na humanidade. Que há anjos sempre a nossa volta, cuidando de nós e nos mandando ajuda quando precisamos. Tenhamos fé, que ao mesmo tempo em que linhas de sangue existem, as azuis também estão presentes, basta você abrir os olhos e ver.

Nenhum comentário

Postar um comentário

Layout por Maryana Sales - Tecnologia Blogger